A arte de transformar um sonho em pesadelo…
estapafurdiosdoquotidiano, 22.01.17
O Estapafúrdios do Quotidiano foi confrontado com uma situação um pouco bizarra, mas que já é apanágio do mundo infernal das Editoras Portuguesas e não só. Há poucos dias atrás, uma editora portuguesa – que, obviamente, não iremos dizer o nome para evitar processos judiciais, mas que tem o nome de uma famosa zona de Lisboa onde existiu um enorme incêndio em 1988… – entrou em contacto com o RIC na tentativa de saber se queríamos enviar uma obra de nossa autoria para ser publicada pela editora em questão. E o RIC fez o que se pedia e enviou um amontoado de estapafúrdios que podiam resultar num livro bem catita. Dois dias depois, a resposta chegou. E foi algo deste género:
Editora: Boa tarde, caríssimo autor.
RIC: Boa tarde. Ou será antes boa noite? É certo que ainda são 18h00, mas como já está de noite não será mais boa noite? Ou a questão aqui prende-se apenas e exclusivamente com as horas? Sabe, é que não faz muito sentido e, com toda a certeza, deve estar de acordo comigo, certo? Diz-se boa tarde quando ainda é de dia, mas assim que o sol se põe passa a desejar-se uma boa noite, independentemente das horas que sejam. Certo?
Editora: Hã?
RIC: Então? Em que é que ficamos? Boa tarde ou boa noite?
Editora: É boa tarde, obviamente, pois ainda são 18h00…
RIC: Ai isso agora é assim? Então, vamos supor que não existiam relógios neste mundo. Como é que você sabia que tinha de desejar uma boa noite a alguém?
Editora: Quando ficasse de noite, é claro…
RIC: AH! Então tem de me dar razão! Se já é de noite mas ainda são 18h00, passa-se a desejar-se boa noite ao invés de boa tarde. Sendo assim, então boa noite. Como está?
Editora: Eu… Ah… Sim, boa tarde. Aliás, boa noite ou algo do género. Bom, não sei se está recordado, mas eu entrei em contacto consigo para que me enviasse uma obra de sua autoria, o que, de facto, veio a suceder-se. Depois de uma elaborada análise à sua obra, eu tenho novidades para si, caríssimo autor!
RIC: Essa do caríssimo também tem muito que se lhe diga. Isso é apenas uma questão de educação e cordialidade, ou você quando diz isso pensa realmente que eu sou uma pessoa cara? Do género: “Ai, mas esta besta é muito bom autor, mas deve cobrar bem caro pelas suas obras…” Hum?
Editora: Caro autor… sabe, eu tenho mais que fazer. Não possuo tempo para dissertações absurdas.
RIC: Oh, não tem mas continua a chamar-me de caro. Enfim, tudo bem. Prossiga, então…
Editora: Muito bem. Como estava a dizer, eu tenho novidades para si. Aliás, são mesmo muito boas notícias! Após profunda análise à sua obra, concordámos em avançar para a publicação da mesma!
RIC: A sério? Nã, você está apenas a meter-se comigo.
Editora: Nada disso. Vamos mesmo avançar para a publicação da sua obra. Pois todos concordámos que se tratava de uma obra bastante engraçada, com imensa qualidade e que tem tudo para vender muito.
RIC: A sério, onde estão as câmeras? Isto é para que programa?
Editora: Eu sei que custa a acreditar, porque a publicação de um livro de nossa autoria é sempre um sonho que se vê realizado, mas garanto-lhe que não se trata de chacota, mas sim da realidade: a nossa editora vai publicar o seu livro.
RIC: Oh pá… Perdoe-me, mas eu não consigo evitar soltar uma pequena e esguia lágrima de contentamento.
Editora: Não tem problema algum. Nós já estamos habituados a realizar sonhos e receber essa reacção dos autores. Nós entendemos perfeitamente.
RIC: Obrigado. Mil obrigados. Então e agora? Quais são os passos a dar?
Editora: O processo agora é muito simples. Nós temos a seguinte proposta para si: vamos publicar a sua obra em livro e também em ebook. A obra será distribuída por todas as livrarias do país, ficando igualmente disponível no Brasil.
RIC: UAU! UAU!
Editora: O autor receberá ainda a percentagem de venda de cada livro, variando os valores de livro para ebook, e caso a venda do mesmo seja feita através do site da editora ou de livrarias.
RIC: UAU! UAU!
Editora: As percentagens são de 30% para o autor, caso o livro seja vendido através do site da editora e 10% se for numa livraria.
RIC: UAU! UAU!
Editora: As promoções e apresentações do livro, assim como cartazes ou posters, ficarão ao encargo da editora.
RIC: UAU! UAU! Estou a viver um sonho, não estou?
Editora: Não, está é a realizar um sonho! Bom, mas os sonhos também têm um preço para se realizarem. Para avançarmos com a publicação do livro, o autor tem de desembolsar cerca de 2000 euros.
RIC: UAU! UAU!
(Pausa)
RIC: Eu sabia que isto ia resultar em pesadelo…
RIC